sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Colar...


Após um longo silêncio de ausência, presenteaste-me com o teu melhor sorriso e um convite para te acompanhar. Pediste-me que usasse o meu melhor vestido porque a ocasião era solene e juntamente com o teu pedido surgiu uma caixa de veludo com um colar de pérolas.
Acedi ao teu pedido e à hora combinada estava pronta com o meu vestido vermelho de cetim que fazia sobressair o colar que me ofereceste. Escolhi este tom de vermelho porque pensei que assim te seria impossível não reparar em mim. Não me beijaste quando te abri a porta.
Deste-me o braço para que todos reparassem que entravas acompanhado, mesmo que o resto da noite não pretendesses fazê-lo. Perante todos foste capaz de dizer o que em privado há muito deixaste de me dizer e sorrias enquanto passeavas as tuas mãos pelas minhas costas despidas de tecido e sobretudo de ti. Deixaste-me só no salão e trocaste-me por conversas circunstanciais.
Elogiaram-me o colar que me tinhas oferecido e só então percebi o quanto ele começou a pesar. Tomei o peso do colar enquanto acariciava cada pérola ironicamente perfeita, juntamente com as quais me ofereceste a tua presença e os sorrisos convencionais perante a presença dos outros e beijos trocados quando alguns olhares pousavam sobre nós. Para ti, sempre fui um adereço para o teu teatro de aparências. O adereço perfeito que se adequava momentânea e exclusivamente ao sabor da tua vontade.
O colar que me ofereceste começou a sufocar-me, tal como a minha cedência ao teu jogo particular. Chamei o teu nome para que me ouvisses e quando me concedeste atenção, levei a mão ao colar e arranquei-o violentamente. Enquanto as pérolas rolaram no soalho, olhei-te nos olhos e afastei-me de ti. Nem nesse momento foste capaz de te dobrar para apanhar as pérolas que nos afastaram.

Walter

6 comentários:

Esquissos disse...

Gosto muito do texto, em especial do final. Está muito bom mesmo! Continuas poderoso com as palavras.

Abração

Draco

Esquissos disse...

Só podia ser um vestido de cetim vermelho :)

Gostei do texto... as tuas palavras nunca deixam de me transportar para a cena dos acontecimentos... Gostei da comparação entre o colar e a relação dos dois...

Bjinhos
Jane

Andreia disse...

"as minhas costas vazias de ti" Muito bom!

***

Maria Laura disse...

Um quadro perfeitamente d(escrito) duma relação em que alguém é mero adereço. Muito bom.

Amor amor disse...

Escrevendo no feminino, que lindo!!! Olha, eu vi a cena claramente na minha frente, e que cena: cheguei a ver cada pérola se desprendendo, caindo e pulando no chão, enquanto ela virava de costas, e seu vestido a acompanhava em seu gesto forte, e cheguei a ouvir a música parar, e sór ouvir os passos firmes dentro do sapato de salto fino.

Você escreve deliciosamente bem, e é surpreendentemente tridimensional. De onde vem o teu poder, menino?
Por acaso, escondes algum bonsai sagrado que é fonte de tua inspiração? ;o>

O máximo, Walter! Parabéns!!!

Beijinhos doces cristalizados, e um ótimo fim de semana!!! :o*

Anónimo disse...

MAGNIFICO, Adorei, está simplesmente EXCELENTE.

Beijinhos
A tua fã N.º1 :)lol